Nada é tão canalha que não possa se mostrar absolutamente cafajeste. Enquanto emissoras “amigas” que moram, quentinhas, no bolso do poder, tentam frear o derretimento da “popularidade” do chefe vendendo mentiras a preço de banana; a verdade segue seu curso. Segue sua marcha irrefreável na tarefa de afastar as cortinas que durante dois anos de trevas impuseram um silêncio aterrorizador a uma população inteira, calando a imprensa (mas pode me chamar de “vai pagar quanto?”), intimidando servidores e espalhando mentiras perfumadas tendo subterrâneos sórdidos sob os pés. O que você vai ouvir aqui é a prova cabal da frieza, do descaso e dos mais mesquinhos interesses de um governo incapaz de se mostrar sensível mesmo diante do sofrimento de crianças e adolescentes assolados pela fome e pelo descaso. A coluna revela hoje, para o bem de toda verdade e para o mal de toda mentira cretina, como a irresponsabilidade oficial pode ser nefasta. Como a indiferença dos poderosos pode impactar a vida de inocentes. Como o egoísmo bandido pode, em nome de um marketing oficial mentiroso, adoecer pessoas e causar enorme sofrimento humano. As vítimas da tirania dos farsantes são crianças e adolescentes em estado de vulnerabilidade social mas não só elas, como se isso já não fosse tragicamente o bastante. As vítimas também são todos aquelas pessoas que ousaram desafiar o sistema, peitar os poderosos e revelar o que se queria esconder. As vítimas são mulheres assediadas moralmente por um governo inescrupuloso que um dia, cavalgando sobre as próprias vertigens de baixa altitude, achou mesmo que poderia, com dinheiro e intimidação, calar uma cidade inteira. A verdade é fluída como a água e sempre há um furo que, por menor que seja, começa a vazar. Uma hora a represa não suporta e entra em colapso. No artigo de hoje, áudio traz trecho de entrevista mantida entre este colunista que vos fala direto de Brasília (DF) todos os dias, e a assistente social Elaine Rosa; pivô do escândalo humanitário da Associação Lar, casa de acolhimento de crianças e adolescentes de Guaíra (SP), que deveria ser mantida e fiscalizada pela prefeitura da cidade, não por acaso, terra natal deste jornalista. Como bem se sabe por revelações feitas aqui mesmo, descobriu-se, pelo trabalho corajoso de Elaine, que enquanto os menores “assistidos” pela casa-abrigo passavam fome submetidos a um cardápio de “arroz com salsicha”, o senhor prefeito Antonio Manoel e seus intrépidos sequazes faziam de tudo para esconder o descaso e tirar Elaine do caminho, assediando-a e forçando sua demissão do poder público e afastamento das funções de interventora da casa-abrigo. A luta solitária de Elaine diante da fúria e da ira de um prefeito pego com as calças na mão já fizeram história. Não sem antes causar um sofrimento enorme e o adoecimento da assistente social, fragilizada numa luta de Davi contra Golias.
O FUSCA E O ÁUDIO
Como se ouvirá no áudio aqui disponibilizado, Elaine Rosa é aquele tipo de profissional de Serviço Social que vai muito além das atribuições oficiais do cargo. Vinda de origem humilde, Rosa sabe muito bem do que se trata a luta diária para ser “gente”, para escapar da exclusão social. É por isso que, quando entrevistada por este colunista, Elaine contou que colocava crianças assistidas pela Associação Lar dentro de seu próprio carro, um “Fusca”, para levá-las para tomar sorvete e se encontrarem com suas próprias e desestruturadas famílias, num esforço pessoal da assistente para viabilizar a ressocialização aos menores abandonados pelo poder público. “O que eu queria era que os meninos fossem tratados como gente”, afirma uma Elaine emocionada e aos prantos num dos trechos mais pungentes do áudio. “Ser gente”, diante da frieza e do descaso do Governo Antonio Manoel, é uma tarefa árdua. Insalubre, como se verá a seguir.
“EU ACHO QUE EU ME DEI MUITO MAIS DO QUE EU DEVERIA”
No trecho hoje revelado, Elaine conta, para espanto de todos os que tem caráter, que o Governo Antonio Manoel procurou,pasme, culpá-la pelos relatórios que trouxeram à tona o escândalo. “ELES FALARAM QUE O MEU RELATÓRIO ERA PARA PREJUDICAR O PREFEITO E A MARIA ADRIANA (A ENTÃO DIRETORA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL)”. Não senhor prefeito. Permita-me discordar. O relatório da corajosa interventora era, na verdade, para salvar crianças que o senhor abandonou, por meio de sua Diretoria de Assistência Social. O RELATÓRIO, SENHOR PREFEITO, NÃO ERA SOBRE O SEU UMBIGO OU DE SEUS BAJULADORES; ERA SOBRE CRIANÇAS QUE ESTAVAM PASSANDO FOME DENTRO DE UMA INSTITUIÇÃO QUE DEVERIA SER ABASTECIDA E FISCALIZADA PELA PREFEITURA. O áudio também revela, em detalhes chocantes, o sofrimento de Elaine mesmo um ano depois de ter deixado o governo.Distante do antigo e tóxico trabalho, a assistente social conta que ainda convive com os traumas causados pela experiência radioativa de ser correta e legalista numa administração recheada de transgressores e afirma, novamente às lágrimas: “eu acho que eu me dei muito mais do que eu deveria”. Não Elaine, permita-me discordar. Você fez o que é certo. Você agiu dentro da lei. Você defendeu os despossuídos. Você foi corajosa diante de uma matilha de covardes. Você fez mais Elaine. Você mostrou, com a retidão de seu caráter, que nenhuma mulher, por mais “indefesa” que pareça, pode se curvar diante de abusadores psicológicos. O poder e o dinheiro podem até, como dizia Nelson Rodrigues, comprar “amores verdadeiros”, mas não são nada diante de almas destemidas.