O cheiro do laquê invade o corredor, misturado ao perfume doce das fantasias. Era Carnaval, e nada importava mais do que dançar, dançar e dançar. O chão do salão coberto de confetes coloridos parecia o céu estrelado virado do avesso. A serpentina voava solta, desenhando caminhos invisíveis no ar.
Branca de Neve, Cinderela, Fadinha, Mulher Maravilha... cada fantasia tinha uma história, e cada história virava realidade por algumas horas. Na matinê, o mundo era nosso. Lá, onde as marchinhas embalavam os passos e a energia parecia infinita, éramos todas princesas, super-heroínas e donas do nosso próprio baile encantado.
Em casa, o vinil da Beth Carvalho rodava sem parar na vitrola. "A chuva cai lá fora, você vai se molhar..." e a voz dela era um abraço. Na televisão, ainda em preto e branco, as escolas de samba desfilavam e eu, pequenina, já torcia com o coração. Em São Paulo, era Vai-Vai e Rosas de Ouro; no Rio, Mangueira e Beija-Flor.
Entre uma dança e outra, o cheirinho do bolo de fubá da cozinha chegava de mansinho. E havia o girassol na janela. Sempre ali, seguindo o sol, mesmo nos dias nublados. Talvez ele soubesse o segredo da alegria: olhar sempre para a luz, mesmo quando o céu insistia em derramar suas lágrimas.
Hoje, fecho os olhos e volto para aquele tempo. E percebo que, mesmo adulta, ainda carrego a criança que pula, que dança e que encontra motivos para sorrir em cada confete que a vida joga. Porque, no fundo, o girassol ainda está lá, na janela da minha alma, seguindo o sol e me lembrando que a festa continua.